segunda-feira, 7 de junho de 2010

O eterno sabor da saudade.

Quase todos os dias de tardezinha, era sagrado eu e os amigos da rua batermos palma na casa do portão azul; Todos descalços e com o chinelo entre os dedos das mãos. Era um uníssono “Seu Tonho, pode pegar goiaba?”
Ele, um senhor já bem de idade, mineirão forte, de bigodinho tradicional, vinha todo simpático abrir o portão, enquanto que sua "velha" – forma carinhosa que ele se dirigia a sua esposa – observava com aquele olhar nada amistosa, debruçada na janela de batente também azul, da cozinha.

Sempre tive uma relação amigável com meus vizinhos, e eles por sua vez eram recíprocos. Na casa do Sr. Joaquim da casa cor-de-rosa, eram ameixas daquelas amarelas e limão cravo que chupávamos com sal e sem fazer careta; Já na casa da Dona Guiomar era batata-pirulito e mandioca que o Sr. João trazia de sua roça e a gente comprava - ok! as vezes pegávamos emprestado quando ele não estava por lá – e assávamos na fogueira enquanto conversávamos a noite na pracinha, quando ainda nem existia uma de verdade.

Mas na casa do “seu Tonho” era especial. Aquela goiabeira carregadinha e o chão forrado de frutas maduras e amarelas. Para nós aquilo era ouro. Gostávamos do Sr. Antônio não por interesse pelas goiabas, mas porque ele sabia conquistar a criançada e as vezes ameaçava até subir no pé com a gente. Já sua esposa só resmungava e não via a hora de irmos embora.
Nessa época eu ainda não tinha perdido meu avô e como os dois tinham coisas em comum eram minhas referencias de seres humanos pelas histórias que eles contavam e eu ficava ouvindo atentamente.

Até hoje quando passo por aquela calçada amarela e olho para aquela goiabeira, que foi a única coisa que restou, me bate uma saudade e me faz voltar no tempo em que eu chegava em casa com uma sacola cheia de goiabas e ouvia uma bronca da minha mãe, “já foi incomodar o Sr. Antônio?”. Me recordo ainda das vezes em que eu voltava para casa com uma sacola de lona cheia de compras e uma caderneta na mão e ele sentado num banquinho azul de madeira me convidava a sentar do seu lado. Enquanto eu descansava, aproveitava para ouvir suas histórias. Ao me despedir, ele ainda brincava comigo “Pode ir menino, eu cuido da bolsa pra você!”

Pra minha surpresa, antes do meu próximo aniversário aquele banquinho ficou vazio. Eu ainda abria o portão da minha casa e arriscava uma chance de vê-lo, mas a única coisa que ocupava aquele lugar era uma sombra constante de um pé de café que ele plantara do lado de dentro do quintal.

Recordar as lembranças faz bem pra alma, ainda mais quando essas lembranças são boas. Por isso tento fazer o melhor, dar o meu melhor para que um dia alguém se lembre de mim contando somente as boas histórias das muitas que eu também já contei. Só assim, nos tornamos eternos, mesmo tendo a vida limitada pela mortalidade.




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